segunda-feira, 26 de março de 2012

Cannibal Corpse - Torture



Artista: Cannibal Corpse
Álbum: Torture
Data de lançamento: 13 Março 2012
Género: Death Metal
Editora: Metal Blade Records
Lista de faixas:

1 – “Demented Aggression”
2 – “Sarcophagic Frenzy”
3 – “Scourge of Iron”
4 – “Encased in Concrete”
5 – “As Deep as the Knife Will Go”
6 – “Intestinal Crank”
7 – “Followed Home Then Killed”
8 – “The Strangulation Chair”
9 – “Caged…Contorted”
10 – “Crucifier Avenged”
11 – “Rabid”
12 – “Torn Through”

Já lá vão mais de vinte anos de carreira e doze álbuns de estúdio. E mesmo assim, os Cannibal Corpse ainda são das bandas mais extremas e brutais que andem por aí à vista e que consigam liderar o estilo em que enquadram. E o avanço na idade não os parece abrandar em nada. A violência que carregam ainda é a mesma e a cada novo álbum o desbotar de velocidade bruta ainda se faz sentir.

Com doze discos já guardados e com um estilo que os define tanto, a banda já conseguiu encontrar o seu sítio na secção de bandas que não têm muitos passos a dar na variedade e que não têm qualquer justificação para experimentalismos – querem outra obra como a dos Morbid Angel? – e que o seu fã quando espera um novo álbum espera uma nova dose de brutalidade bem pútrida e de levar com um bom banho visceral de riffs grotescos, baterias psicóticas e vocais tenebrosos. Mas mesmo assim não é por isso que todos os discos soem iguais, o ouvido atento do fã mais dedicado consegue distinguir cada disco mesmo após o fim da fase Chris Barnes que foi quando permaneceu com um som-base.

Os anos da controvérsia já lá vão e o choque da capa de “Butchered at Birth” e do conteúdo lírico de “Tomb of the Mutilated” já lá vão, portanto se querem dizer que ouvem Cannibal Corpse porque vos faz parecer muito fixes e maus, hoje em dia já nem as T-Shirts mais carnosas vão servir de muito. A banda já cimentou o seu estatuto lendário e mantém-se lado a lado com outros grandes actos a liderar o Death Metal como bem o conhecemos. O conteúdo violento das letras já se encara como a abordagem artística, um dos requisitos, faz parte do género como se de um filme de terror mais sádico se tratasse.

Para além das habituais letras que quase nos dariam umas quantas ideias para assassinarmos algumas pessoas que gostemos menos, não fossem os ouvintes indivíduos mais mentalmente sãos do que o retrato normalmente pintado pela sociedade mais conservadora ou primitiva, temos a habitual enxurrada de riffs que prometem deixar uns quantos pescoços doridos, os solos doidos – incluindo um belíssimo solo de baixo em “The Strangulation Chair” – a bateria que se encontra mais técnica que no anterior “Evisceration Plague” e os vocais monstruosos que já conhecemos de George “Corpsegrinder” Fisher, uma das muitas vozes guturais mais influentes, juntamente com o homem que substituiu, Chris Barnes.

Isto é aquilo que já temos em mente quando nos preparamos para ouvir o disco. Isso e as melodias que parecem passar despercebidas no meio de toda a força bruta asquerosa que vai enchendo o ouvido de delícia àquele que delirar com isto e de pavor àquele que encontrar nisto um demónio a evitar. Os níveis de Groove que existiam em “The Bleeding” jamais serão igualados ou repetidos, não só porque é passado mas porque convém deixar esse disco como uma experiência singular. Mas não deixa de haver nos brutais temas dos Cannibal Corpse uma certa dedicação a melodias de ficar no ouvido. Não é por essas melodias que deixa de parecer que nos queiram arrancar o cérebro à dentada, enquanto nos estrangulam com o nosso próprio intestino e nos empalam com arame farpado. É aquela harmonia entre os dois que eles já andam a fazer e bem há mais de duas décadas.

No entanto, como o álbum segue uma linha contínua no que diz respeito ao som da banda, tem que haver algo que o distinga dos outros. E todos têm, mesmo que passe despercebido a outro ouvido que não tenha tanta voracidade. Mais recentemente “Kill” marcou por ser um passo em frente na evolução da banda em termos sonoros e de produção. “Evisceration Plague” foi um lançamento sinistro que parecia funcionar mais como uma morte lenta e dolorosa, algo que não fosse tão rápido e intenso, como a faixa-título indicava. Este “Torture” parece ter a sua principal conexão com “Kill” e parece pegar outra vez no ponto que referi para o “Evisceration Plague” num tema como “Scourge of Iron”. “Followed Home Then Killed” – um dos temas que mais destaco – parece ser uma obra técnica a lembrar algo de um “Bloodthirst”, enquanto que “Crucifier Avenged” tem uma certa reminiscência a uma “Sentenced to Burn” do “Gallery of Suicide”. Não são cópias, apenas temas bons que fazem lembrar outros temas bons. Logo o que se pode considerar é que o ponto de distinção principal deste “Torture” pode ser uma espécie de compilação de um pouco de tudo do melhor que se tem feito na era de Corpsegrinder, sem ter que recorrer a todo aquele saudosismo da era Barnes.

Mas mesmo como é, sem ir tão fundo nesses pormenores, é um disco cujo rótulo não nos engana nem nós queríamos tal – volto a lembrar a última obra dos Morbid Angel… Não valia mais terem-se ficado pelo que sabem fazer bem? A quantidade de sangue, tripas e pus vem exactamente como queríamos ou mais ainda. Os riffs de nos deixar o cérebro em papa de tanto abanar a cabeça vêm com tanta força como a requerida ou mais ainda. Ou seja, um conjunto de temas que vinha tal como desejávamos que viesse. Ou se calhar melhores ainda.

Avaliação: 8,2


terça-feira, 20 de março de 2012

Necromanther - Between Mankind and Extinction



Artista: Necromanther
Álbum: Between Mankind and Extinction
Data de lançamento: 29 Fevereiro 2012
Género: Blackened Death Metal, Metal progressivo
Editora: Independente
Lista de faixas:

1 – “Opal”
2 – “Beneath the Moonlight”
3 – “A Sacred Passage”
4 – “Peak of Imagination”
5 – “Sungrave (Album Version)”
6 – “To Rein in Dusk”
7 – “Toneless Scarlet”
8 – “A Portrait of Obscurity”
9 – “Between Mankind and Extinction”

O Facebook deve ser a maior ferramenta de procrastinação actual. Muito tempo lá se passa e pouca coisa de lá se tira. Mas há que ir tentando, por vezes podem aparecer algumas surpresas agradáveis. Na habitual rotina do “scroll down” na dominante rede social lá no meio das lamentações púberes, do vírus/spam que controla os ingénuos em tudo o que é canto, das obras dos pseudo-fotógrafos do espelho, das trocas de mel entre os casalinhos que se preocupam mais em mostrar essa lambuseira ao público do que em ter alguma essência e de mais uma data de pretéritos perfeitos mal conjugados e hífenes onde não deviam de existir… Por vezes até aparece algo que vale a pena.

Um exemplo de conhecimento de novas bandas em que não fui eu que fui de encontro a isto, mas sim que veio ter comigo. Apresentado por vários da lista de amigos e a certo ponto pelo próprio criador deste projecto, Necromanther apresentava-se como uma proposta interessante para saciar o habitual desejo de encontrar algo de peso e de valor. Aproveitando a “promoção” que foi a oferta temporária do download do álbum, tive que deitar ouvido a isto já com bastante confiança no que o underground de peso Português muitas das vezes fornece.

E não deixou qualquer espaço para desilusão e fez valer a pena toda a confiança em si depositada. Com Valter Abreu a comandar todos os instrumentos, apresenta-se aqui uma daquelas boas fusões prováveis entre o Black e o Death Metal com riffs carregados de escuridão e peso a demonstrar a técnica por cima de uns ocasionais blast beats que deixam qualquer um ceder-se ao seu encanto. Tudo bem ornamentado pelo trabalho vocal que pode remontar tanto para às obras de Black oriundas da Noruega como para um Death Metal de sangue Sueco.

As canções fogem completamente da estrutura habitual e pendura-se com força e convicção a estruturas progressivas para aumentar o interesse em ouvir este registo, sem que faça lembrar outra coisa já ouvida antes e também puxa para mais audições para que se descubram novos pontos que ainda não se detectaram às primeiras vezes. E ainda para servir de fermento para fazer este iniciante projecto crescer já com tanto imediato vem outros arranjos experimentais que enriquecem a atmosfera já tenebrosa que havia, seja através de usos tanto mais ou menos subtis de piano ou pelas paragens semi-ambientais que se encontram em alguns dos temas. Em nenhum momento se procura ter momentos iguais a outros – com “A Secret Passage” fica-nos a impressão de ouvirmos um tema de Black Metal melódico influenciado por actos como Abyssos ou Amortis, enquanto que em “A Portrait of Obscurity” entra logo a matar de forma a que nos lembre um Death Metal potente numa vertente mais moderna.

Estilos algo genéricos mas bem misturados e que após se imbuir em arranjos e experiências que demonstram ambição e visão imaginativa, tornam este principiante projecto – de acordo com a minha pesquisa, o projecto deu os seus primeiros passos em 2005, com este registo a estrear-se em longa-duração após uma Demo em 2009 – algo bastante singular e atractivo, que se deva manter de olho.

Não há nada a perder no futuro, apenas a ganhar e potencial para engrandecer ainda mais este projecto e torná-lo ainda mais único está bem presente por entre as linhas melódicas e brutais que por aqui se ouvem. “Necromanther” é um projecto a manter debaixo da pálpebra e uma das muitas boas razões para ir botando alguma atenção ao underground metálico Português que tem tantos frutos frescos com idoneidade para se conseguirem internacionalizar no valioso campo de peso Europeu...

Avaliação: 8,4


segunda-feira, 19 de março de 2012

[Clássico do Mês] Tears for Fears - Songs From the Big Chair



Artista: Tears for Fears
Álbum: Songs From the Big Chair
Data de lançamento: 25 Fevereiro 1985
Género: Rock, Pop Rock, New Wave
Editora: Phonogram Records, Mercury Records
Lista de faixas:

1 – “Shout”
2 – “The Working Hour”
3 – “Everybody Wants to Rule the World”
4 – “Mothers Talk”
5 – “I Believe”
6 – “Broken”
7 – “Head Over Heels”
8 – “Listen”

E porque não destacar os Tears for Fears nesta secção como um dos melhores e mais maduros actos na música Pop dos anos 80? Já tinham eles surpreendido com a sua capacidade lírica e melódica com “The Hurting”, disco de estreia e os seus singles de sucesso e tinham então que lançar-se ao segundo trabalho com o intuito de superá-lo. Roland Orzabal, principal vocalista do colectivo Britânico, afirmou que a única intenção que tinham para o segundo álbum era a de fazer algo capaz de vender mais alguns discos. Nos dias correntes isso soa a algo mau para se dizer, e naquele tempo era praticamente igual. O que não se esperava era que realmente fabricassem hits instantâneos mas que carregassem tanta essência.

Mesmo que a música Pop da década de 80 não desse tanto para comparar com a música Pop actual, isto mesmo para a altura dava para se considerar como uma obra Pop bastante inteligente. Logo mal irrompe com o hino “Shout” que tanto carrega de belo como de assombroso. O tema é facilmente reconhecível ao ouvido comum e também bastante capaz de lá ficar. A sua viciante melodia acompanhada da bela instrumentalização e produção invejável capaz de tornar o tema intemporal são componentes que se podem distinguir como contribuidores para que se faça um êxito com tanta dimensão e vendas e ao mesmo tempo apresentar algo tão complexo e belo.

Segue-se “The Working Hour” à qual perdoo-lhe a introdução que utiliza saxofones da maneira que eu menos gosto – não dos maiores fãs desse “smmoth jazz” – mas rapidamente passa o que realmente importa. Parecia que carregava uma enorme responsabilidade em seguir uma canção tão rica como “Shout” e, mesmo mantendo sempre a sua qualidade, particularmente lírica, não parece ter a mesma força que o single anterior. A verdade era que, na verdade, também servia de aquecimento para a belíssima faixa que viria a seguir.

“Everybody Wants to Rule the World” é um tema que também pode muito bem representar a banda e o seu legado e da parte pessoal, consta entre as minhas predilectas canções do grupo e até das principais escolhas de “Play repetido” no que diz respeito a playlists pessoais. A canção em si não tem nenhum defeito por onde lhe dê para se pegar no caso de se desejar criticar negativamente a música em si. A música muito rapidamente seduz com a sua melodia suave e com a sua batida de background propícia a viagem solitária e acaba por soar àqueles temas que dão para parar e pensar ou para viajar para longe sem sair do sítio.

“Mothers Talk” já vai descolada da aparente responsabilidade que “The Working Hour” tinha anteriormente, ao suceder um enorme tema a salivar sucesso comercial. Já dá para perceber que os pontos altos vão dispersos mas bem trabalhados para o disco funcionar bem como um todo. No entanto “Mothers Talk” ainda consegue agarrar bem o ouvinte ainda abalado pela faixa anterior com um refrão que leva simplicidade e frenesim e um trabalho de baixo que permite a Curt Smith brilhar – após ter tido o seu grande momento na parte vocal de “Everybody Wants to Rule the World”. Tinha faísca suficiente para fechar a primeira parte em grande.

Quão bem a segunda parte começa é que já pode variar para cada ouvinte. A ideia de acalmar as águas com uma suavíssima balada melancólica com toques de Soul não é uma má ideia, apenas pode aborrecer alguns dos ouvintes que anseiam mais por ritmos mais envolventes. “Broken” que se segue abre o portão para a faixa seguinte – após captar já alguma atenção com a melodia de piano – “Head Over Heels” que nem é preciso dizer que é outro single quando a sua estrutura de “não-te-vou-sair-da-cabeça-durante-o-resto-do-dia” já revela tudo. Dos principais destaques, a par com os outros singles – neste caso os singles destacam-se não por serem os mais acessíveis, são mesmo os melhores.

“Listen” fecha então o disco com a sua forma ambiental e com um perfil muito “chill out”, assim que Curt volta a deslocar-se para a frente para tratar da parte vocal central. Acaba assim mais um disco capaz de cativar qualquer fã da New Wave da década de 80 ou qualquer um que possa apreciar algo completamente diferente. A intenção de Orzabal em vender discos nota-se e ele até insistiu que não tem mais nenhuma intenção na sua música para além dessa, mesmo que pareça transportar uma forte mensagem. Mas leva muita qualidade e muito trabalho acrescentado, podendo-se até sentir a brisa da janela entreaberta para o progressivo – que depois escancara-se mais no sucessor “The Seeds of Love”.

É pena que hoje em dia a banda não permaneça tão notável – pelo menos de nome, mesmo que as músicas sejam reconhecidas. Pessoalmente, permanecem como uma das principais bandas de escolha, sempre que vou de encontro a alguma alternativa às coisas mais ruidosas e pesadas que tanto prazer me dão. E tanto a nível pessoal como a nível geral no repertório da banda, “Songs From the Big Chair” permanece como um dos principais discos – ou o principal disco – representativo da sua carreira, recheado com muito do que melhor e mais correcto existia na música Pop dos anos 80.


["Ai Louvado..." do Mês] Dee Dee King - Standing in the Spotlight



Artista: Dee Dee King
Álbum: Standing in the Spotlight
Data de lançamento: 1989
Género: Hip Hop Old School, Punk Rock, Rap Rock
Editora: Warner Bros. Records
Lista de faixas:

1 – “Mashed Potato Time”
2 – “2 Much 2 Drink”
3 – “Baby Doll”
4 – “Poor Little Rich Girl”
5 – “Commotion in the Ocean”
6 – “German Kid”
7 – “Brooklyn Babe”
8 – “Emergency”
9 – “The Crusher”
10 – “I Want What I Want When I Want It”

Ramones é um daqueles nomes históricos que não precisam de qualquer apresentação e que deve desbloquear de imediato algumas vénias de respeito. Inegável influência vital na música Punk na sua forma pura e a erguer já os alicerces para o Pop Punk que anos mais tarde se viria a denegrir por completo. Temas de fácil cantoria, escritos para o abanar de cabelo sujo enquanto se porta a velha T-Shirt já meia desbotada e as calças de ganga rotas no joelho. Lendas de admiração quase unânime com alguns dos maiores hinos assentes em curtas e directas canções que não se enchiam de floreados, sempre com a mesma receita faziam pratos semelhantes porque eram o preferido de toda a malta que os seguia.

É uma apresentação desnecessária, já todos sabemos quem são os Ramones. Ainda para mais porquê falar neles? É que isto infelizmente, não é Ramones… Numa fase conturbada no percurso de carreira da banda, desbotaram problemas entre membros. Dee Dee Ramone, influente músico cujo talento no Punk não se nega e cuja importância para a escrita de grandes canções da banda fizeram-se sentir, deixa a banda e parte para a reabilitação na tentativa de deixar os seus problemas com a heroína – na qual ele voltaria a cair e ditaria com ela o seu trágico fim em 2002, após overdose. Quando voltou não vinha com vontade de voltar a pegar no baixo como costumava e aparentava não estar tão virado para o ruidoso Punk que o tornara famoso. Infelizmente saiu isto.

Começo já por dizer que este disco tem muitos defensores dedicados que encontram qualidade no registo, canções divertidas e defendem que Dee Dee estava muito à frente do seu tempo – um Rapcore ainda a brotar aqui? Tudo bem, não me oponho a essas opiniões, mas temos que ter em conta o tiro ao lado que foi este Dee Dee Ramone, com o cognome “Dee Dee King”, quando um ícone do Punk tenta lançar um disco em que demonstra que não tem grande jeito para o Rap e que o seu verdadeiro nicho é o que estava a fazer anteriormente e que o tornou famoso.

Torna-se algo difícil até fazer qualquer tipo de crítica, quando existem incertezas quanto à forma como encarar isto. Levar isto a sério e descrever isto como um descarrilamento? Levá-lo para a brincadeira e agrupá-lo naquele termo que já usei muito neste espaço, o “So Bad It’s Good”? Difícil. Mas certo é que se passava bem sem isto.

Dee Dee Ramone, ou melhor, Dee Dee King abraça a cultura Hip Hop com um rap constrangedor que não parece sequer seguir qualquer tipo de ritmo existente na música. A própria parte instrumental era de uma timidez tremenda, com um trabalho de banda a tentar igualar o que os actos de Hip Hop faziam com samples, mas soando muitas das vezes a “outsider”, alguém que não está dentro do assunto. Safam-se um pouco os temas “Poor Little Rich Girl” ou “The Crusher” – mais tarde regravada pelos Ramones no seu disco final “Adios Amigos!” – que ainda soam a regulares temas Punk que poderiam ter sido regravados e rearranjados pela sua banda de origem. Isso só acrescenta a ideia de que mais valia ficar-se por aí.

A notar-se temos a participação de Debbie Harry – dos Blondie, para os mais dispersos – em vocais que, muito infelizmente para ela, só tornam as canções ainda mais embaraçosas. Em “German Kid” – cujo conteúdo lírico também é suficientemente bom para levar à forca – guincha-se “Half American/Half German” de maneira mais que suficiente para o franzir de sobrancelha permanente que apenas se desfaz após algum tempo de silêncio pós-musica e pós-reflexão.

Resumindo: Dee Dee Ramone foi um grande músico talentoso, o seu legado permanecerá para sempre e que a sua alma seja mantida na maior paz possível. Mas quando se lançou à experiência de “Standing in the Spotlight” ficou uma nódoa escura e irremovível no seu trabalho: ele não serve para o Hip Hop, estava longe de ter skills de rapper, as letras eram tremendamente infantis e a abordagem musical pretendida era demasiado desconcertada. Fica no ar a dúvida acerca da seriedade do projecto, se teria sido feito com o intuito de servir de piada ou não. Mas de qualquer das formas, o seu nome já ficou associado a uma “obra” destas.

Já vi este álbum ser apontado como um dos maiores falhanços na história da música gravada ou uma das mais humilhantes notas de rodapé na história da cultura popular. Assim como também já vi fortes argumentações defensivas que distinguem o álbum como uma obra subvalorizada e incompreendida. Ambas são aceitáveis, opiniões foram feitas para diferir, mas quão melhor passava Dee Dee Ramone sem este tópico no seu currículo? Admito que se calhar até já incluí coisas piores nesta secção – se calhar – e confesso que seja qual for o lado em que se fica em relação à opinião do disco, consegue ser divertido.


sexta-feira, 16 de março de 2012

Napalm Death - Utilitarian



Artista: Napalm Death
Álbum: Utilitarian
Data de lançamento: 27 Fevereiro 2012
Género: Grindcore, Death Metal
Editora: Century Media Records
Lista de faixas:

1 – “Circumspect”
2 – “Errors in the Signals”
3 – “Everyday Pox”
4 – “Protection Racket”
5 – “The Wolf I Feed”
6 – “Quarantined”
7 – “Fall on Their Swords”
8 – “Collision Course”
9 – “Orders of Magnitude”
10 – “Think Tank Trials”
11 – “Blank Look About Face”
12 – “Leper Colony”
13 – “Nom de Guerre”
14 – “Analysis Paralysis”
15 – “Opposite Repellent”
16 – “A Gag Reflex”

Já se passaram 25 anos desde que o álbum “Scum” saiu ao mundo e agarrou a música extrema pelos tomates, mudando-a permanentemente e apresentando um género influenciador que garantiria um local privilegiado aos Napalm Death na árvore da evolução da música pesada. Aquilo que hoje conhecemos como o “Grindcore” foi apadrinhado por este grupo Britânico e desde então que muitos bons grupos apareceram a tocar o tal dito cujo, mas nunca ninguém que o fizesse tão bem como os Napalm Death.

A carreira do grupo avançou sem afrouxamentos e hoje é o dia que os membros da banda andam na casa dos 40 mas com tanta ou mais garra do que quando começaram. Iniciaram-se há umas décadas atrás com um som brutal de influência Punk envernizado com um Death Metal do mais extremo. Seguiu-se uma década de 90 mais experimentalista com entradas de Groove, Thrash e outros que foi permitindo à banda mexer-se sem se sentir presos mas sem se deslocarem para muito longe. Hoje simplesmente fundem as duas eras e aparecem-nos com este “Utilitarian” a soar a uma banda severamente irritada. E danados sejam eles se quem ouvir não acaba tão irritado como eles.

É nessa raiva que reside o principal ponto de partida para qualquer álbum de Napalm Death: riffs estonteantes de partir pescoços, a rapidíssima bateria tão maltratada e bem tratada ao mesmo tempo e uns rugidos ou ladrares reconhecíveis de Barney Greenway, com canções directas ao assunto. E nisso são sempre competentes, nunca falham em transmitir uma violenta dose de brutalidade na sua música e nas suas letras com escarradelas políticas capazes de abrir forçosamente os olhos a quem ouve.

O que ainda torna este “Utilitarian” ainda mais fascinante é o facto de que hoje em dia nem se pedia mais que isso para termos o que queremos deles, já não têm absolutamente nada a provar visto que já sabemos bem quem eles são e o que eles bem fazem. Mas mesmo assim lançam-se a uns interessantes experimentalismos que ainda engrandecem mais a banda em vez de parecer algo descabido – também não há nenhuma fuga para qualquer território. Pode-se dizer que eles não se deslocaram do seu sítio para ir buscar outras influências, elas é que foram ter com eles.

Exemplos disso podem ser aquele doido solo de saxofone que se ouve em “Everyday Pox” que ajuda a tornar a faixa única – o que não se estranha é o portador do saxofone, John Zorn, um homem que já tem alguma experiência em embelezar obras extremas. Outro exemplo e este ainda mais surpreendente. Já todos sabemos e reconhecemos a voz gutural de Greenway, o que talvez nunca esperássemos era ouvi-lo a cantar limpo! Pelo menos dentro dos possíveis, sem amaricar muito a coisa, até pelo contrário. A experiência semi-cantada de “The Wolf I Feed” para além de surpreender também consegue dar ainda mais garra e bastante feeling de Punk ao tema. Outro apontamento será também a utilização de uns bizarros e obscuros coros gregorianos em temas como “Fall on Their Swords” ou “Leper Colony” que quase lhe dão uma atmosfera gótica se não se tivesse adequado tão bem à brutalidade de assinatura da banda, que nem um traseiro a instalar-se na marca deixada num sofá após anos de uso contínuo no mesmo local.

Mas são apenas mais uns toques, umas quantas cerejinhas para colocar no topo do bolo que já era delicioso como estava ao termos temas tão directos e espontâneos e ao mesmo tempo tão técnicos, como os Napalm Death bem sabem fazer. Porque após a introdução instrumental “Circumspect” – que por si só já acaba também por ser uma experiência – que já estamos prontos para o enxerto de porrada e valente carga de lenha que levamos assim que “Errors in the Signal” irrompe pelos nossos ouvidos dentro. E assim se mantém ao longo dos seus curtíssimos 45 minutos. E assim que conclui o delicioso riff final de “A Gag Reflex”, que o nosso primeiro instinto e vontade é o de voltar ao início.

Vinte e cinco anos e não tarda nada, as três décadas de carreira que tão gloriosas se podem considerar já estão ao virar da esquina. E os Britânicos ainda com a mesma fúria, garra e agressividade com que surpreenderam o mundo da música extrema com a sua brutal abordagem singular e exclusiva. O que não é debatível aqui é o facto de os Napalm Death terem-lhe perdido o jeito com os anos, ninguém pensa tal. O que pode dar que pensar é se por acaso eles não estão ainda melhores. Porque hoje em dia por muito boas ou curiosamente engraçadas que possam ser algumas bandas de Grindcore, ainda não há outra banda que o faça com tanta brutalidade e ao mesmo tempo tanta classe como os Napalm Death. E é mais uma banda cuja passagem pelo nosso país já constará com certeza na agenda de muitos headbangers nacionais…

Avaliação: 8,7


quinta-feira, 15 de março de 2012

Eluveitie - Helvetios



Artista: Eluveitie
Álbum: Helvetios
Data de lançamento: 10 Fevereiro 2012
Género: Folk Metal, Death Metal melódico
Editora: Nuclear Blast
Lista de faixas:

1 – “Prologue”
2 – “Helvetios”
3 – “Luxtos”
4 – “Home”
5 – “Santonian Shores”
6 – “Scorched Earth”
7 – “Meet the Enemy”
8 – “Neverland”
9 – “A Rose for Epona”
10 – “Havoc”
11 – “The Uprising”
12 – “Hope”
13 – “The Siege”
14 – “Alesia”
15 – “Tullianum”
16 – “Uxellodunon”
17 – “Epilogue”

Apesar de toda a originalidade e diversão que se notou à volta do Folk Metal aquando da sua imersão, infelizmente conseguiu encurralar-se em termos criativos, com cópias sem sal a saírem cada vez mais para o povo. Muitas das bandas até eram engraçadas, mas nada para ficar agarrado que as distinguisse de muitas outras. Com isto, a devoção e atenção ao género tem que se voltar aos actos que mais conseguiram singrar e distinguir-se. E os Eluveitie são com certeza dos principais nomes que saltam à mente quando se juntam os termos “Folk” e “Metal”. Capazes de sobrevivência e até de representar o género, o grupo Suíço tem em “Helvetios”, mais um disco de valer a pena – debatível se superará outros como o impactante “Slania” lançado em 2008.

Não só o grupo mostra como sabe manter-se ainda a remar nestas mesmas águas, mas parece mostrar que ainda não estabilizou totalmente no seu som. Ainda é o típico Death Metal melódico de sangue Sueco misturado com umas divertidas melodias folclóricas feitas à base de instrumentos tradicionais como violinos, flautas, gaitas-de-foles ou a belíssima sanfona – ou viola de roda – que vemos internacionalmente a ser chamada de “hurdy gurdy”. O que pode realmente variar é a forma como abordam o som, pois parecem compilar aquilo que melhor fizeram nos discos anteriores e colocá-lo neste disco.

Primeiro exemplo é o trabalho vocal de Anna Murphy. A sua bela voz já se conhecia de alguns vocais secundários nos anteriores discos. Mas após a bem sucedida experiência acústica que foi “Evocation I: The Arcane Dominion”, já parece haver maior procura de integrar a voz de Murphy nas canções. E se tal já se fazia notar em “Everything Remains as It Never Was”, então em “Helvetios” já temos canções protagonizadas pela voz feminina como em “A Rose for Epone” – tema que se agarra bem ao nosso ouvido e com muito gosto – ou “Alesia”. Apenas mais um ponto forte descoberto para a banda.

Quantos ao trabalho vocal restante, já conhecemos bem a voz berrada de Chrigel Glanzmann que mais uma vez trabalha sem pecar. Uma certa extremidade diferente do habitual nos berros num tema como “The Siege” parece fazer desta uma das canções mais pesadas do repertório dos Suíços.

A parte instrumental das músicas é realmente caso para dizer que é o costume, mas os Eluveitie são um dos exemplos dos casos de aqueles que mantêm um som corrente porque assim se quer. O que exactamente se pediu na encomenda é o que exactamente vem no pacote e temos neste extenso disco a habitual harmonia entre o pesado e o pagão e helvético. A parte dos riffs agressivos que nos propiciam ao abanar de cabeça como já bem se sabe e a parte folclórica que nos incita a dançar, tudo posto sobre a mesa em simultâneo para originar aquela mistura soberba que tanto nos fez gostar do Folk Metal em primeiro lugar no seu aparecimento antes de ficar tão estancado.

E se 17 faixas parece algo muito extenso, existem sempre os interlúdios ambientais para deixar os outros temas fluir e para descansar um pouco. E mesmo numa hora de duração, consegue passar bem e com rapidez, flui muito facilmente e em nenhum momento começa a maçar. E referente às tais “Interludes” ambientais, existe em “Helvetios” uma proposta interessante que é o tema “Scorched Earth”, cujas opiniões possam diferir principalmente devido à extensão dessa faixa em particular mas que eu achei bastante interessante.

Como sendo um CD que funciona tão bem na sua inteira forma, não se torna assim tão fácil destacar faixas, principalmente quando todas têm esqueletos semelhantes, mas apontando e enumerando apenas alguns exemplos para vaga ideia: “Helvetios” ao início que nos deixa bem despertos e com ouvido aberto para o que se segue, “Meet the Enemy” ou “The Siege” como representantes da faceta mais agressiva aqui presente – principalmente quando se situam após as calmas e ambientais “Scorched Earth” e “Hope” – e “A Rose for Epone” e “Alesia” com a belíssima voz de Anna Murphy a acrescentar mais um ponto de assinatura ao som característico do grupo.

Não parece haver nada negativo a apontar, principalmente devido à banda que é. Nunca se pode considerar os Eluveitie como mais uns, mas sim como aqueles. Logo o que pareça ser mais um é, na verdade, um dos principais a manter debaixo de olho. Ainda para mais quando nem a própria banda se limitou a apresentar-nos mais um trabalho seu e colocou aqui fruto de um bom esforço para se manterem sólidos e inteligentemente consistentes. E saiu daí “Helvetios”, um dos mais fortes registos da sua já nem tão humilde discografia. Cá os esperamos para o Vagos Open Air…

Avaliação: 8,8


terça-feira, 13 de março de 2012

The Cranberries - Roses



Artista: The Cranberries
Álbum: Roses
Data de lançamento: 22 Fevereiro 2012
Género: Rock alternativo, Pop Rock, Rock Céltico
Editora: Cooking Vinyl, Downtown Records
Lista de faixas:

1 – “Conduct”
2 – “Tomorrow”
3 – “Fire & Soul”
4 – “Raining in My Heart”
5 – “Losing My Mind”
6 – “Schizophrenic Playboys”
7 – “Waiting in Walthamstow”
8 – “Show Me”
9 – “Astral Projections”
10 – “So Good”
11 – “Roses”

Acho que todos já conhecemos bem os Cranberries. Quer tenham vivido a década de 90 já maduros, quer ainda fossem crianças. Através de algum irmão mais velho, de algum vizinho que gostava de aumentar o volume das suas colunas ou simplesmente naquela situação em casa em que fica a TV ligada num canal de música para dar ambiente a tarefas como as limpezas. Acho que é seguro dizer que todos tivemos contacto com a música da banda Irlandesa pelo menos uma vez.

A verdade é que, essa espécie de “hype” deu-se na década de 90 com alguns discos suficientemente jeitosos para garantir o sucesso mas com hits de destaque como é o caso de “Zombie” – que muitos dos apreciadores da banda apontam como sobrevalorizada e com letra fraca em relação a outros trabalhos da banda. Hoje em dia os Cranberries são uma banda de nostalgia e jamais atingirão o mesmo pique que tiveram nessa década que parece ter sido há tão pouco tempo mas que já se meteu uma inteira depois dela. Para completar a marcação da banda num específico período dá-se o hiato oficial que coloca a banda em pausa.

Passam-se anos, dão-se as experiências, os discos a solo desapercebidos de Dolores O’Riordan, a reunião para uma digressão e as saudades do estúdio apertam, logo anunciam a preparação do seu primeiro disco em dez anos. Algo arriscado sabendo que os Cranberries já tinham conquistado o estatuto de banda de nostalgia, saber se a preparação de um disco que arriscava-se a soar datado ia ser boa ideia. E também ter a inspiração no devido sítio para criar obras que soem familiares aos fãs que lhes compraram os discos nos anos 90, sem parecer algo preso no tempo.

Tinham muito que trabalhar e o seu resultado mantém-se nas linhas do razoável, mas por acaso não se pode considerar pouco competente por isso mesmo. O som “Folk Pop” que se apoia simultaneamente nas bases do Pop Rock alternativo e da música tradicional/folclórica Irlandesa para criar dóceis melodias está de novo presente, como os fãs bem se lembravam. Aí já reside suficiente para que o CD se junte aos restantes da colecção sem parecer um estrangeiro a tentar infiltrar-se, com mais audições pode-se juntar ao restante catálogo.

A voz de Dolores ainda não mostra qualquer sinal de envelhecimento. Também pior seria, passaram-se anos desde a época deles, mas ela ainda é jovem. Não temos nenhumas “brincadeiras” à volta das cordas vocais da vocalista com algumas “guinadas” e desafinações artísticas como já se achava piada ouvir em alguns êxitos clássicos como “Zombie” ou “I Can’t Be with You”, mas o seu trabalho vocal ainda está de se aclamar da mesma forma que sempre esteve – espere-se que a experiência sussurrada em “Waiting in Walthamstow” não incomode ninguém.

Se gostavam das habituais/ocasionais malhas mais hiperactivas com um certo destaque às guitarras, é apenas isso que está em falta, em relação ao que já conhecíamos. O que predomina no álbum são as canções suaves orientadas pelo lado Céltico que os caracteriza e pelas melodias Pop/Rock que lhes garantia um lugar à sombra em estações de rádio e TV. Portanto não existe em “Roses” nenhum sucessor para canções como “Salvation”, por exemplo.

Não existe muito risco e se há alguma ambição em especial, pelo menos ainda estão de pés assentes e ainda existe alguma humildade. A intenção era manter-se fiéis à veia que lhes era conhecida – deixando a parte mais agitada de lado – e nisso sucederam. Não se descobre aqui o fogo nem se inventa a roda, apenas se procura um local confortável para se instalar. E é o suficiente para agradar os antigos fãs, creio eu. E mesmo que pareça ter passado um pouco o prazo de validade e parecer algo entalado na década de 90… Enquanto não trouxerem as boy-bands, os Technotronic, os Ace of Base e o Vanilla Ice de volta, uma viagem de volta aos 90’s não parece uma experiência assim tão má ou assustadora…

Avaliação: 6,9


segunda-feira, 12 de março de 2012

Earth - Angels of Darkness, Demons of Light II



Artista: Earth
Álbum: Angels of Darkness, Demons of Light II
Data de lançamento: 6 Fevereiro 2012
Género: Drone Metal, Rock experimental/instrumental, Pós-Rock
Editora: Southern Lord Records
Lista de faixas:

1 – “Sigil of Brass”
2 – “His Teeth Did Brightly Shine”
3 – “Multiplicity of Doors”
4 – “The Corascene Dog”
5 – “The Rakehell”

Uma paragem de quase uma década na carreira dos Earth foi o suficiente para originar uma mudança de som na banda. Em 2005 lançaram “Hex; Or Printing in the Infernal Method” após hiato e aí afastaram-se um pouco do grotesco e ruidoso som Drone distorcido. A sua influência já estava mais que feita e mesmo que o som que tenham praticado após esse período seja muito mais limpo, não deixamos de associar o nome “Earth” ao género Drone.

A parte interessante é que tal mudança não tinha 100% de segurança de resultar completamente e tal podia originar a formação de uma base de fãs nova, conquistando uma data de novos apreciadores e fugindo da atenção dos antigos. No entanto, não há maneira como crucificar Dylan Carlson pelo rumo que quis tomar com o seu projecto, quando a música que continuou a compor ainda era de uma qualidade respeitável e com o mesmo tom ambiental e experimental que lhes deu a fama que obtiveram na década de 90.

Já com a primeira parte, o “Angels of Darkness, Demons of Light I” lançado no ano anterior se notava que apostava-se cada vez mais forte nas melodias calmas e na bizarra influência de Blues, Folk e até Country num som Pós-Rock. Já assim estava estabelecido. A parte boa é que mesmo mantendo-se dentro desse espaço, têm muito por onde experimentar e Dylan Carlson e companhia atiraram-se sem medo aos experimentalismos, compondo um disco que tanto tem de abstracto como de confortável.

O disco começa de forma algo sombria e não ouvimos o trabalho de bateria de Adrienne Davies – envolvida numa relação com Carlson, o que pode ajudar para que sejam os únicos membros originais restantes da formação do grupo – até à terceira faixa “A Multiplicity of Doors”. Não é que fosse necessária nas duas faixas anteriores e certamente não é que se dispensasse nos três temas seguintes, eles é que sabem mesmo o que estão a fazer.

A música que se desenrola lentamente nas cinco faixas é daquelas que descrevê-las ao detalhe é perda de tempo. Ritmos assinalados por baixo eléctrico – onde reside a parte mais orelhuda da música, melodias instrumentais arrastadas que me ficam na memória já vêm desde exemplos do “The Bees Made Honey in the Lion’s Skull” – e a guitarra de Dylan Carlson a “cantar” muito suavemente. Se quiserem uma ideia da forma de tocar tão simples e no entanto tão formidável de Dylan, “His Teeth Did Brightly Shine” é um bom exemplo.

A bateria que toca de forma tão seca mas que cumpre tão bem a tarefa de completar as canções, enquanto o ambiente que já se sente é mais bem “floreado” com o uso de violoncelo. Uma maneira que eu encontro de descrever vagamente isto é com uma estranha metáfora ou uma bizarra personificação: os instrumentos todos a dialogar entre si. E que conversa têm eles. Sempre sem acelerar o passo e com o mesmo ritmo monótono que os caracterizou – há que ter atenção que uso o termo “monotonia” num bom sentido, fosse toda a monotonia assim e eu voltava a ter metade das aulas que tive no secundário e passava a frequentar a missa bissemanalmente.  

É na elasticidade desta fórmula e quanto mais conseguem experimentar dentro disto que reside todo o fascínio à volta do colectivo Americano e das composições de Carlson. Um disco tão maduro, tão ambiental e que tão bem transmite uma sensação de paz e ao mesmo tempo um sentimento agitado. Segue a mesma linha da parte anterior e a sua qualidade iguala-o ou possivelmente o supera ligeiramente. Duas eras diferentes de Earth: mas será fácil decidir qual a melhor?

Avaliação: 8,4


sexta-feira, 9 de março de 2012

Buckethead - Electric Sea



Artista: Buckethead
Álbum: Electric Sea
Data de lançamento: 21 Fevereiro 2012
Género: Rock experimental, Rock instrumental, Acústico, Ambiente, Avant-Garde
Editora: Metastation
Lista de faixas:

1 – “Electric Sea”
2 – “Beyond the Knowing”
3 – “Swomee Swan”
4 – “Point Doom”
5 – “El Indio”
6 – “La Wally”
7 – “La Gavotte”
8 – “Bachethead”
9 – “Yokohama”
10 – “Gateless Gate”
11 – “The Homing Beacon”

Presença assídua neste blog pela sua assiduidade também no que diz respeito a lançamentos de discos. Todos os anos temos mais que um disco de Buckethead para desfrutar, para assim que acabarmos de fazer a digestão de um bom álbum do guitarrista, termos de imediato um novo para saciarmos a fome que nunca chega a ter muito tempo para se desenvolver. E ainda o melhor é que é um dos artistas que mais e melhor se consegue reinventar com tantos géneros diferentes que ele consegue abordar e a facilidade com que ele parece efectuá-lo. Ora temos discos ambientais, como obras Funk, ou riffs de Metal bem pesadinhos ou um Rock instrumental na sua pureza. Desde que dê para o bizarro intérprete experimentar como lhe dê na real gana, tem sempre muito que fazer e fá-lo bem.

Em “Electric Sea”, o talentoso músico volta a seguir caminhos mais calmos ao procurar melodias mais suaves e ao dar-nos da boa música ambiente, daquela que dá para ouvir de olhos fechados. Foi o que ele escolheu abordar ao longo do ano de 2010, por exemplo, em “Shadows Between the Sky” que mantém-se como um dos meus predilectos álbuns para usar como ferramenta de relaxamento, daqueles que nos embalam para uma pacífica noite de bom sono – principalmente aquela faixa-título.

Era mais ou menos esse álbum que eu tinha em mente para criar a expectativa para ouvir este “Electric Sea”, quando soube que era um som quase do género – quase, porque este senhor não faz coisas iguais ou parecidas. Que agradável surpresa que tive, quando ainda superou a expectativa. Aquelas melodias suaves daquela guitarra tão bem tratada cujo choro certamente não é de dor, já pronto a embalar-me e a levar-me para outro sítio. E isso que era em plena tarde, num inusual dia quente de Inverno, com o Sol a entrar-me pelo quarto dentro e estando eu bem desperto. Mas já me estava a acolher para outra “mood” completamente diferente.

Não me recostei a tirar uma sesta relaxado por esta maravilha, porque queria tomar atenção ao que ouvia antes dessa experiência e realmente nem com mais atenção dá para se encontrar por aqui defeitos. Logo que entra a primeira faixa já fico seduzido pela mágica guitarra de um tipo tão esquisito mas que faz obras tão bonitas e assim se manteria. Nada deteriorativo a apontar, mas para destacar há sempre a faixa “El Indio” que ainda foi a que mais fascínio me solicitou.

Para além das suas novas composições, completa-se a lista com “Beyond the Knowing”, uma regravação do antigo tema “What Kind of Nation”, gravado em cooperação com o actor Viggo Mortensen em 2005; abordagens inteligentes e bem conseguidas de temas clássicos como “La Wally”, composto por Alfredo Catalani em 1892 e “La Gavotte” e “Bachethead” compostos por Johann Sebastian Bach; e acrescentando ao fim “The Homing Beacon”, uma das canções de tributo a Michael Jackson – por estranho que possa parecer, um grande ídolo de Buckethead – que lançou anteriormente à solta, sem integrar nenhum disco. Tudo bem organizado para constituir uma perfeita obra ambiental – mesmo faixas como “Yokohama” ou “Gateless Gate” que parecem estar aqui mais para encher conseguem a sua dose de maravilha.

No final, finalmente aterramos suavemente após uma interessante viagem mental que é a única coisa que me ocorre para descrever alguns dos melhores discos deste estranho indivíduo. Nem soa a algo para ser muito lembrado no futuro a não ser que já sejam dedicados fãs do músico, e por vezes até são temas que talvez não passem de mais do que música de fundo para uma apresentação de powerpoint ou para dar ambiente no site pessoal. E mesmo para isso é formidável. Ainda não me desprendo de “Shadows Between the Sky”, mas noto aqui em “Electric Sea” um dos melhores discos de Buckethead ultimamente. E sim, “ultimamente” já envolve muitos álbuns…

Avaliação: 8,4

quinta-feira, 8 de março de 2012

Van Halen - A Different Kind of Truth



Artista: Van Halen
Álbum: A Different Kind of Truth
Data de lançamento: 7 Fevereiro 2012
Género: Hard Rock, Heavy Metal
Editora: Interscope Records
Lista de faixas:

1 – “Tattoo”
2 – “She’s the Woman”
3 – “You and Your Blues”
4 – “China Town”
5 – “Blood and Fire”
6 – “Bullethead”
7 – “As Is”
8 – “Honeybabysweetiedoll”
9 – “The Trouble with Never”
10 – “Outta Space”
11 – “Stay Frosty”
12 – “Big River”
13 – “Beats Workin’”

Já se passaram catorze anos! 14 anos desde o último disco da banda de Eddie Van Halen. Mas isto após lá passar vários vocalistas, incluindo Sammy Hagar e uma experiência desastrosa com Gary Charone dos Extreme. No entanto, fãs de Van Halen não costumam pensar muito no que diz respeito ao vocalista que preferem e qual a era favorita. Foi sempre o carismático David Lee Roth – que contém um pouco de sangue Português nas suas ascendências – que mais agradou. E é aí que entra a parte interessante, este é o primeiro disco de novo com David Lee Roth… em 28 anos! Já tanto tempo que eu nem posso dizer absolutamente nada quanto a isso… Ainda faltavam quase 10 anos para eu ser concebido!

No entanto, é verdade, o impossível parece ter acontecido, David Lee Roth está de volta. Após uma digressão com ele mesmo, eis que acontece o mais difícil: a banda de “Jump”, “Hot for Teacher”, “Runnin’ with the Devil” ou “Panama” trazem-nos um disco novo! O único aqui a impedir de assistirmos a uma autêntica reunião da velha guarda é a ausência de Michael Anthony no baixo e nos vocais secundários – que muitos sentirão a falta. Com isso temos uma formação mais Van Halen que nunca, com Wolfgang Van Halen, filho de Eddie a integrar a banda. Isso faz com que o grupo agora tenha três quartos de músicos de nome “Van Halen” e David Lee Roth.

Parece estar tudo no sítio para uma reunião a valer. Vontade de tocar, o bom e velho Rock ‘n Roll, nostalgia ou só mais uns dólares. Alguns desses devem ter contribuído para a reunião e sejam eles quais foram, o que temos a fazer é aproveitar. Uma reunião destas é a ideal para uns quantos concertos, para recordar os clássicos, encher umas quantas salas de gente de meia-idade que queira viajar um pouco no tempo enquanto dança e mais alguns jovens recentemente iluminados pela música da banda, descoberta pós-fim – eu, por exemplo, ainda estou praticamente na fase púbere e não me importava de lá andar. No entanto, no que diz respeito a discos, nem sempre pode ser boa ideia. Os dias dos álbuns já lá vão e muitas das vezes quando se reúnem e se sentem na obrigação de utilizar um disco como “desculpa”, sai algo sem inspiração. E o single “Tattoo” parecia apontar para aí. Era um tema engraçado, mas faltava-lhe garra. Mas graças sejam dadas  ao benefício da dúvida por permitir a audição do disco, mesmo com as expectativas do single.

Afinal o que aqui se encontra são uns Van Halen ainda em excelente forma. 13 temas que nem parecem muitos, ao não conter nenhum material desnecessário. A voz de David Lee Roth já tem a idade como barreira para fazer o que fazia nos seus bons e velhos dias, mas ainda continua reconhecível e com boa forma dentro do possível. Quem ainda está impecável é Eddie Van Halen que ainda não perdeu força, velocidade e técnica nos dedos e ainda nos dá riffs e solos que nos lembram porque é que o seu nome vem sempre ao de cima quando alguém menciona grandes guitarristas do Rock de todos os tempos.

Não há como ficar desiludido com o seu trabalho de guitarra em todas as faixas, mas destaco o imediato princípio de “China Town”, a Rockalhada bem maciça de “Bullethead”, a rapidez envolvente do riff e solo de “As Is”, o toque mais pesado e moderno de “Honeybabysweetiedoll”, os toques de blues de “Stay Frosty”ou o solo impecável de “Big River”. Apenas alguns exemplos, porque se bem conhecemos Eddie Van Halen sabemos que não há maneira de fazer este homem falhar na guitarra – no entanto houve uma altura que virou-se para os sintetizadores.

Mas como manter toda a força da música actual e mantendo o feeling clássico com o toque dos seus velhos tempos, sem parecerem uns velhotes a tentar ser “cool” e a ficar a meio do caminho? Trabalhando canções antigas perdidas, demos que ficaram para trás na década de 70, ainda antes de o disco de estreia ver a luz do dia. Não há como falhar quando o esqueleto destas canções já vem da raiz da juventude da banda e nota-se bem a onda. Portanto este conjunto de temas tem aquilo que conhecíamos e gostamos: David Lee Roth e Eddie Van Halen a garrear a ver quem rouba a luz da ribalta e atenção a quem. Esse conceito pode não soar muito bem, mas é uma das coisas que mais encanto dá à música dos Van Halen e sempre foi assim – e nem sequer há certezas e até se duvida que eles já se dêem bem outra vez, mas sinceramente pelo que se ouve, ainda não parece fazer diferença.

É um belo presente aos fãs antigos – aquela “Stay Frosty” é muito apontada como uma nova “Ice Cream Man”, popular faixa do disco de estreia – e se conseguir projecção talvez capture mais alguns novos que depois queiram ir espreitar o que foi feito há umas décadas atrás. Não é nada que se possa dizer de especial, mas cumpre muito bem o seu dever e não se pode negar a sua competência: não soa aos Van Halen a tentar juntar uns quantos temas para levar para a estrada e ganhar mais uns trocos, soa à mesma diversão que os Van Halen proporcionavam desde antigamente – sim claro, porque eu já lá andava desde 1978. E após tanto tempo sem nos dar nada novo, é de aplaudir a forma como trazem ao mundo um disco com tanta genica e garra suficiente para se manter a par com actos mais jovens. Quem é que é velho, afinal?

Avaliação: 8,1


terça-feira, 6 de março de 2012

Anthony Green - Beautiful Things



Artista: Anthony Green
Álbum: Beautiful Things
Data de lançamento: 17 Janeiro 2012
 Género: Indie Pop, Folk Rock, Rock alternativo
Editora: Photo Finish
Lista de faixas:

1 – “If I Don’t Sing”
2 – “Do It Right”
3 – “Moon Song”
4 – “Get Yours While You Can”
5 – “When I’m on Pills”
6 – “Can’t Have It All at Once”
7 – “Big Mistake”
8 – “Love You No Matter What”
9 – “How It Goes”
10 – “Just to Feel Alive”
11 – “James’ Song”
12 – “Blood Song”
13 – “Lullaby”

“Beautiful Things” chama ele ao álbum e pode muito bem referir-se às canções que escreveu para o fazer, tal é o positivismo com que canta aqui, algo pouco usual no repertório de Anthony Green. Tudo devido a uma grande mudança na sua vida, assim que casou – maneira estranha de lhe ficarem a conhecer a esposa, mas é a rapariga da capa – e foi abençoado com um filho que já completou o seu primeiro ano de existência. Tal viragem na vida causou uma mudança no método de escrita ainda honesto do músico, cujo vasto currículo – Circa Survive, Saosin ou The Sound of Animals Fighting são apenas alguns exemplos – que por vezes anda nas beiras do Post-Hardcore/Emo, não costumava apontar.

É com essa mesma honestidade e de forma directa que Green nos apresenta estas treze canções com os seus amigos dos Good Old War a servir de banda back-up. É com a ajuda dessa banda, a juntar ao talento para as melodias do talentoso vocalista que se forma aqui um som de sangue Folk e alternativo, com pitadinhas Hipster e com todo o experimentalismo a residir na simplicidade para tornar o disco ainda mais sincero que o que já é à primeira vez que se “despe” para os nossos ouvidos.

O toque para as melodias salienta-se bem para fazer com que o álbum sobreviva para além da apreciação dos elementos musicais e guarde também algumas canções na cabeça logo de imediato. “If I Don’t Sing”, “Get Yours While You Can”, “Just to Feel Alive” ou a interessante experiência a capella de “Do It Right” conseguem muito bem personificar a parte melódica dos refrães das canções.

O trabalho vocal esse já o conhecemos e Anthony Green é um portador de uma das vozes mais impressionantes no que diz respeito ao seu campo, com o habitual tom agudo – bem trabalhado, e maldito seja o dia em que disseram aos gajos do Screamo que cantar agudo os ia tornar numa grande coisa – com uma boa dose de rouquidão e outros tons para a tornar imediatamente reconhecível e inimitável. É no single “Get Yours While You Can” que mais se pode notar e retirar o chapéu ao trabalho vocal impecável do líder dos Circa Survive.

A parte Folk do álbum apesar de seguir uma linha mais genérica, ainda ajuda de certa forma a criar identidade para o registo e de “Love You No Matter What” para a frente é nessa estrada que se mantém e nessa veia que mais se concentra – em “Blood Song” existe um feeling de country que distingue bem a faixa – após umas canções mais inclinadas para o Indie ou para um Pop Rock menos acessível.

Para um ouvido mais atento e perfeccionista não há assim muito para distinguir do seu anterior disco a solo “Avalon”, mas a principal diferença está como é claro, nas letras. O seu casamento e o nascimento do seu primeiro filho conseguiram mudar a abordagem e temos aqui um ponto de vista com muita mais cor do que é habitual na poesia de Green. Tanto ao ponto de termos canções inteiramente dedicadas ao miúdo. “James’ Song” – explícita quanto ao assunto, visto que James é o nome do catraio – é direccionada com ternura ao pequeno enquanto a conclusiva “Lullaby” funciona perfeitamente como uma bela canção de embalar. Mas não é nada disso que retira maturidade ao álbum, até pelo contrário, ajuda a fazer deste um dos álbuns mais adultos de Green.

Muito no entanto, após verificarmos as letras e concentrarmo-nos no som, notámos que o disco ou vai agradar aos fãs mais ávidos do vocalista, que procuram qualquer coisa que tenha mão – ou neste caso voz – do músico para se satisfazerem ou então dirige-se a um público completamente diferente daquele que acompanha o seu trajecto nos Circa Survive. De maneira a que o propósito do álbum não seja muito mais que um projecto, um entretenimento do vocalista, para deitar fora uns quantos sentimentos positivos mais recentes que possua. Porque não acrescenta muito ao seu repertório e sujeita-se a servir apenas de aquecimento para o próximo álbum dos Circa Survive, sem sobreviver a muitas audições repetidas. É uma obra bonita e bastante agradável de se ouvir, mas parece encaminhar-se para passar mais tempo na prateleira do que a tocar…

Avaliação: 7,4